Vivências culturais e produtos do Turismo de Base Comunitária são foco de estudo

Postado por: Observatório

Pesquisa teve início em 2020 e deve resultar em tecnologia social e inovação enquanto produto turístico no estado de Mato Grosso do Sul com possibilidade de gerar renda para comunidades

Denise desenvolveu estudo sob orientação da professora Patrícia

Bruaca é o nome dado para as malas rústicas de couro cru que os pantaneiros levam, no lombo dos cavalos, durante as idas e vindas das comitivas. Nas bruacas, eles levavam alimentos e roupas necessários para enfrentar os longos dias e noites atravessando o Pantanal para conduzir o gado. Bruaca também foi o nome escolhido para dar título ao projeto que estuda as vivências culturais e produtos do turismo de base comunitária em Miranda, MS e desenvolvido pelas pesquisadoras Patrícia Zaczuk Bassinello e Denise Silva.

Patrícia é professora no Programa de Pós-graduação em Estudos Culturais do Câmpus de Aquidauana, da UFMS. “Supervisionei o trabalho de pós-doutoramento de Denise sobre o potencial turístico e os saberes ancestrais das comunidades tradicionais do Pantanal. Um dos resultados foi o projeto Bruaca: vivências culturais e produtos do Turismo de Base Comunitária”, explica. Denise é presidente e uma das fundadoras do Instituto de Pesquisa da Diversidade Intercultural (Ipedi) e, atualmente, também atua como professora visitante do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal da Grande Dourados.

“Minha motivação para fazer o pós-doutorado em Estudos Culturais vem da minha experiência profissional como linguista e, também, da minha história de vida. Venho de uma comunidade tradicional do Pantanal, convivi com os indígenas desde pequena e sempre tive um fascínio pela língua e pela cultura. Para isso, fiz minha pós-graduação em Linguística, mas percebi que a questão cultural é importante para entender a língua, a cultura e a cosmologia dos povos. Foi assim que surgiu o interesse em fazer um pós-doutorado com essa temática e, assim, estabelecer a relação entre essa temática com a linguística e a cultura, a fim de salvaguardar essas comunidades na manutenção dos seus saberes ancestrais”, conta Denise.

Denise Silva (centro) realizou o estudo durante o pós-doutorado na UFMS

Denise comenta que a experiência durante o pós-doutorado foi transformadora, pois permitiu atender uma lacuna em sua formação, mas também humana por meio de um olhar mais próximo da comunidade e suas necessidades. “Fazer esse percurso teórico-metodológico acompanhado da professora Patrícia, permitiu reviver a minha história de vida, olhar para o local de onde saí e repensar o papel da Universidade enquanto articuladora de políticas públicas. Ainda, a necessidade do fomento de uma rede de instituições e pesquisadores, bem como as possibilidades de criação de negócios de inovação que contribua para a ciência, mas também para o bem viver dessas comunidades que foram historicamente marginalizadas, foram expostas e estão muitas vezes às margens da sociedade”, relata a pesquisadora.

“Muito da experiência, pela própria postura da professora Patrícia permitiu que pudéssemos construir uma caminhada muito singular nessa escuta com as comunidades, dos seus saberes, sabores e seus sonhos. Hoje, temos formatada a possibilidade de produtos turísticos que ofereça as particularidades das comunidades por meio do seu artesanato e cultura, a fim de que seja vivenciado de uma forma verdadeira”, destaca Denise. “O desenvolvimento do projeto permitiu que pessoas cuidem de pessoas, oferecendo protagonismo e canal de fala para as comunidades”, completa.

Segundo as pesquisadoras, o trabalho tem uma relevância social muito importante, já que deve se desdobrar em tecnologia social como processo e inovação enquanto produto gerando renda para as comunidades. “O patrimônio dessas comunidades é um saber que possui poucos registros e, geralmente, transmitido oralmente. Essas iniciativas contribuem para que esse saber seja valorizado, fortalecido e perpetuado para as próximas gerações, impactando positivamente a autoestima desses grupos”, ressalta Denise.

“No momento estamos nos mobilizando para a submissão do projeto em editais de agências de fomento externo, como a Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, da Ciência e Tecnologia, especificamente no edital 31 de 2021 e, posteriormente, no edital 10 de 2022, sobre Mulheres na Ciência Sul-mato-grossense. Também adequamos e submetemos o projeto no Programa Centelha II MS”, conta Patrícia. O Centelha é uma iniciativa promovida pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações e pela Financiadora de Estudos e Projetos, em parceria com o CNPq, o Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa, e Fundação CERTI. Em MS é executado pela Fundect, com apoio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar e do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul. “Também pretendemos incentivar com esta iniciativa a promoção de um trabalho decente e o crescimento econômico do sul do Pantanal, especialmente envolvendo as mulheres e jovens dessas comunidades”, acrescenta a professora.

De acordo com Patrícia, há uma rede de instituições parceiras e pesquisadores envolvidos em tal proposta. “A proposta busca fomentar o tripé de ensino, pesquisa e extensão das universidades envolvidas. Para tanto contamos com uma rede de cursos de graduação e pós-graduação na UFMS tais como os PPGs em Estudos Culturais no campus de Aquidauana, em Administração e Ciências Contábeis da Escola de Administração e Negócios da Cidade Universitária, em Estudos Fronteiriços no campus do Pantanal; na UFGD integram os PPGS em Agronegócios e o Mestrado Profissional em Administração Pública em Rede Nacional”, fala a professora. Ela também ressalta as parcerias com o câmpus do Instituto Federal de Mato Grosso do Sul, em Aquidauana, da  Rede de Saberes para o Turismo do Centro Oeste que compreende as seguintes instituições: Acaia Pantanal,  Ipedi, Ecoa, Instituto Mamede, Muphan, IHP e; do trade turístico da região do Pantanal Sul e, ainda, com duas iniciativas que apresentam propostas voltadas para o fortalecimento identitário de mulheres e fortalecimento comunitário: Acolhida na Colônia, desenvolvido em Santa Catarina, e Badu Design, desenvolvido no Paraná.

Os estudos foram iniciados em 2020 e envolvem as seguintes comunidades: três terras indígenas que compreendem 11 aldeias: Cachoeirinha, Lalima e Pilad Rebua; duas comunidades ribeirinhas: Salobra e Beira Rio e dois assentamentos: Tupã Baê e Bandeirantes, todas localizadas em Miranda, oferecendo, no mínimo, a possibilidade de dez vivências e produtos vinculados ao turismo de base comunitária.

Até o momento, por meio do projeto, foram desenvolvidos a logomarca e um protótipo do portal com algumas das possíveis experiências e produtos mapeados do projeto Bruaca. “As ações a serem realizadas junto ao grupo de parceiros pesquisadores é a fase da elaboração do diagnóstico do projeto e formalização dos potenciais atrativos; visitas técnicas e viagens de campo para realização de oficinas participativas com as comunidades; avaliação com as comunidades do diagnóstico realizado e; elaboração e formalização do roteiro com as comunidades”, complementa a pesquisadora do Cpaq.

“Esperamos com o projeto promover a geração de trabalho decente; o incentivo à práticas de empreender e liderar nos ambientes de negócios; à inovação enquanto fomento de uma outra oferta turística para o estado de MS, à remuneração justa pelo trabalho criado e implementado junto às comunidades, a agregação de valor ao trabalho em um cenário diverso e ao protagonismo das comunidades escutadas pelo projeto”, afirmam Patrícia e Denise. As pesquisadoras também pretendem incentivar a proposição de estímulos à elaboração de políticas públicas mais efetivas e coordenadas que amparem, a bom termo, as demandas das comunidades, inclusive no âmbito da geração de ocupação, da segurança alimentar, da renda, da conservação da sociobiodiversidade e da valorização das culturas, territórios e alimentos por meio do turismo de base comunitária.

 

 

Texto: Vanessa Amin

Fotos: Acervo Ipedi/Bruaca

Fonte: Portal UFMS